quinta-feira, 19 de novembro de 2015

As flautas da abóbada celeste

Não fossem as flautas da abóbada celeste, eu teria permanecido deitada ao lado das margaridas no Jardim. Entregaram-me novas e boas notícias, por meio de um som casual, sobre as leituras das madrugadas velhas. Talvez meus pés descansados desejassem correr para fora do horto, talvez desejassem mais. Voltei a deitar-me ao lado de minhas flores favoritas. Voltei, sim, e assumo ter feito isso para não o deixar só e adormecido, apenas com seu grande coração sentimental, sonhando com os versos do Garoto do Maiakóvski que li minutos antes de abrir meu coração covarde. Não poderia deixar minhas margaridas e meu Dionísio para trás. Já não poderia esquecer. Já não saberia correr. Minha razão, combatendo centelhas do corpo, disse-me para voltar a dormir. Adormeci. Admiti minhas fraquezas como jamais havia feito. Mostrei meus sinais de ausência. Abri minhas gavetas torácicas e deixei que guardasse seu sentimentalismo de bom sujeito. Torneio-o sujeito de minha oração. Pedi ao Cosmos com delicadeza, e as poeiras interestelares nos atingiram, e nos levaram à Nebulosa Laguna, e nos fizeram eternos.

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

O beijo de Nimue

Declarou-se árido e abandonou o lago alfa. Atravessou dois condados com sangue nos olhos. Matou o estado e chegou a Montana. Desconhecia os folclores trazidos pelos ébrios imigrantes. Suou. Sujeitou-se aos costumes. Casou-se com uma antropóloga e se fez objeto. Os anos se passaram e os traços marcaram sua face. Deixou um manuscrito ao lado da cama. Retornou ao lago alfa. O lago mostrou-se ômega. Entregou-se água. Despertou em outro universo. Foi beijado por Nimue.

Folclórica

um conto
esquecido
num folk
a estrofe:
estopim


então você
sem um porquê
jogou no mar
o livro antigo
que te dei
no Natal
sobre o Sal
e um amigo


o tempo secou
os seus pés
e os meus pés
Hefesto desejou


no espaço
da sua varanda
silenciou o som
de Sírinx, sim
talvez se chame Pã


e o suéter cinza
que fiz
com lã de amor
você doou
pro seu avô
em maio


mas os gestos
olhares inquietos
no jeito do amor
o beijo partido
no fim do amar
sua arma secreta
segredo ainda
guardado


no fundo do mar
um manuscrito
esquecido
um livro
você jogou
no fundo do mar
o fim do amor


o tempo secou
os seus pés
e os meus pés
Hefesto desejou